TRISTERESINA (O Terror da Vermelha, 1972)
III - Inaudível
O levantar da obra o cansava. Esgotado até para pensar, pedalava de volta à casa. No ocaso, o fogo dos lampiões começava a acender. O sol a assentar vagaroso no horizonte. Para ele, um contraste puramente divino. Chegara à ponte com o coração igualmente elevado. O chão de terra batida à frente, imaginava maravilhado a travessia com o rio a correr sob os pés. No descer da via, zumbido ao ouvido de cigarra a chamar. De vento ao rosto, o ar mudou. Peso acrescido à garupa. Alguém assentou ali. Parou. De um lado a outro, não avistou vivalma. Com a nuca eriçada, continuou a jornada. Prometeu a si, dali em diante, alocar sempre às costas picareta e enxada.
II - Forragear
O piau debatia dentro do saco. Peixe aguanizava [agonizava por água]. E não o repreendeu. O sol ali demandava fuga. Jogou por mais uma vez a tarrafa. No repuxo, nada além de tecido rasgado no engancho. Acima da ponte, uma mulher levada em bicicleta. Era sua hora de ir.
I - Malváceas
Ela remava sob o luar. Voejar da madeira ao subir e cortar a água. O vestido de renda, outrora branco, abarrotado por entre as pernas. Ao toque úmido, percebeu parte dele para fora. De suor orvalhado à pele, assobio do vento cochichou o calafrio. Descia ao encontro de rios. Entre o amarelo barrento e o turvo esverdeado, recolheu o remo. O sacolejar ritmado da canoa, ondas quebravam como coração pueril. Perturbações solitárias ondulavam o peito, verberavam a volta. Iam e viam imprecisos. Ecos de si. Atou a corda, fechou os olhos e, com esforço, atirou o pedregulho dentro d'água. Afundou igual âncora. Era flor em jardim submerso.
Comentários
Postar um comentário